O presidente Jair Bolsonaro (PL) desembarcou em Moscou nesta terça-feira, dia 15 de fevereiro, quando iniciará uma das mais emblemáticas viagens internacionais de seus três anos de mandato. Não tanto pelos possíveis acordos que poderão advir das reuniões entre Bolsonaro e o líder russo, Vladimir Putin: o consenso entre os analistas internacionais, e mesmo entre a diplomacia brasileira, é que, do ponto de vista prático, muito pouco deve resultar dessa jornada ao maior país do mundo. O elemento de destaque vem da elevadíssima tensão que paira sobre a fronteira entre Rússia e Ucrânia neste momento.
Desde 2014 a Ucrânia vive em guerra civil, com a Rússia apoiando as tropas separatistas rebeldes. A partir de meados de novembro, a Rússia começou a concentrar tropas na fronteira com a Ucrânia, sinalizando uma possível invasão. Atualmente, estima-se que o total de tropas russas ultrapasse os cem mil homens mobilizados, além de tanques, aviões, armamentos etc. Neste período, os EUA têm adotado uma postura de pagar para ver, alertando os russos de que qualquer ação militar terá consequências. E seus aliados europeus da OTAN vêm se mostrando solidários, embora se movimentem sem cessar para baixar a temperatura da crise.
E o esbarrar de ombros entre EUA e Rússia nesta crise da Ucrânia pode ser o ponto de partida para maiores desdobramentos. Em 4 de fevereiro, em meio à escalada retórica entre as duas superpotências, Vladimir Putin viajou para a China, a fim de assistir à abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno. Lá, os dois países divulgaram um comunicado conjunto afirmando o interesse em aprofundar a cooperação nas esferas econômica, política e militar. A declaração repercutiu nas esferas diplomática e econômica, e houve quem anunciasse o início de uma nova Guerra Fria. Para o professor doutor Marcos Cordeiro Pires, pesquisador de relações internacionais da Faculdade de Filosofia e Ciências da Unesp (Universidade Estadual Paulista) em Marília, falar em guerra fria é incorreto, mas está claro que a aproximação entre os dois países é um sinal claro aos norte-americanos de que a competição será mais dura nos próximos anos. “Eles estão sinalizando que as ações americanas também terão consequências”, apontou.
Cordeiro destacou que no momento, o mundo está observando Bolsonaro.
“Neste momento, Bolsonaro está sendo percebido no cenário internacional como alguém radioativo; ninguém quer ser visto perto dele. Não tem interlocução com a União Europeia, nem com o governo Biden. E está vendo diminuir o espaço da extrema-direita na América do Sul. Essa viagem vai permitir a ele projetar prestígio internacional. Bolsonaro vai se reunir com um grande líder mundial, que vai estender o tapete vermelho para ele. E por que Putin vai fazer isso? Neste momento em que a Rússia está sendo constrangida pelo Ocidente, nada melhor para o seu governante do que mostrar que o país não está isolado. Pelo contrário, a Rússia tem amigos, tem prestígio, e a visita de Bolsonaro é um exemplo”, comentou.
[Originalmente, publicado no Jornal da Unesp, reportagem Pablo Nogueira]